“Você só perde o medo de cair, caindo”

Falávamos sobre andar de bicicleta. Ricardo Ampudia é um apaixonado por bikes, daqueles que não somente chegam a 60 Km/h em cima de uma, como se propõe a escrever um blog sobre o assunto. Eu… bom, eu avanço na atividade apenas à medida que entusiastas da prática me incentivam.

Para minha sorte, que sempre tive certa fascinação por ciclistas (talvez porque só me tornei uma há dois anos, quando finalmente aprendi a andar de bicicleta), quanto mais eu pedalo, mais sinto vontade de fazê-lo. E, sinceramente? Tem pouco a ver com contribuir para o meio-ambiente, fugir do trânsito ou mesmo queimar calorias. O que me agrada é a sensação de “caramba, eu consigo fazer isso!”

Pois estava justamente contando ao Ricardo a dificuldade que tenho para fazer o que muita criança executa sem travas sobre uma bicicleta, quando ele me disse a frase do título.  Na hora me lembrei de um texto que havia começado a ler minutos antes. A frase, que me fisgou a ponto de não terminar a leitura, foi: “Conheço pessoas que se casaram mais que cinco vezes. Quando falo com elas sempre tenho a percepção de que nada é para sempre. Elas se mostram muito mais tranquilas ao falar de como o relógio da vida age, lentamente, silenciosamente, mas também, impiedosamente”.

Não entendi direito se essas pessoas, conscientes de que nada é para sempre, covivem melhor com os términos, ou se, mesmo sabendo que nada é para sempre, ainda romanticamente se arriscam.

De qualquer forma, o tombo certo parece consenso entre os que se aventuram. Por excesso de medo ou confiança, vítima de um buraco traiçoeiro ou de um motorista desatento, culpa da rotina ou de um antigo amor, a lição parece ser que você, cedo ou tarde, vai cair. Como e quando vai se levantar – e como agirá quando o fizer – aí  dependerá mais de personalidade e gravidade da queda do que propriamente da aventura escolhida. Não dá para saber.

O que dá para saber é que andar de bicicleta, para mim, é mais ou menos como se casar para algumas pessoas: um movimento de fé. E que, por mais que o tempo e a prática tenham aperfeiçoado o seu pedalar, é sempre bom não sair de casa sem um kit de remendos.

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Minha queda por palmeirenses

Por muito tempo achei que fosse culpa do nariz. Aquele narigão que só homem de dicionário tem. Mas agora começo a pensar que é o conjunto mesmo. Cabelo de quem vai ao barbeiro e não ao cabeleireiro, guarda-roupa que segue uma palheta básica de cores, jeitão de quem se dá bem com todo mundo, até porque não é mala – nem no sentido pedante, nem no puxa-saco.

É o cara que, apesar de tradicionalista, tem jogo de cintura e bom senso para ceder na hora que é preciso ceder (ou que não é, mas o jogo vai começar e, caramba, a gente discute isso depois).

Ele ainda é amigo dos caras do colégio, do prédio, da faculdade. Sai com eles toda semana e estranha um pouco quando um leva o cunhado, “cara legal, mas nada a ver com a turma”. Gosta de passar o domingo com o avô e, apesar de disfarçar, morre de ciúmes se é o prato preferido da irmã – e não o dele – a estrela do almoço em família.

Destrambelhado, um pouco ranzinza, mas sempre charmoso, o palmeirense debate, não discute; argumenta, não constrange; se relaciona, não marca território. Se há mulheres que curtem homem que transforma troféus em chicotes para humilhar “destituídos”, e as que se encantam pelo malandro ingênuo, há as que, como eu, não resistem a um bello… “porquinho”.

Por que ela foi embora

(uma parada no futebol para publicar um texto que há tempos devo a alguns queridos amigos)

Ela não é a mulher perfeita só porque transforma parte dela nos homens com os quais se relaciona, passando a gostar do esporte que ele gosta e a pedir os ovos preparados do modo como ele aprecia, mas porque o coloca no lugar que todos, no fundo, gostaríamos de ocupar na vida de alguém: o centro. Com ela ao lado, esse cara, sem graça no meio da multidão, se sente especial. Ela adora as histórias dele e chora de rir com suas piadas. Vê os defeitos do moço como “charme” e sua falta de trejeitos sociais como “autenticidade” – ela até o acha bonito! E ele, coitado, quase acredita que realmente merece tê-la ao seu lado.

Assim, cego pela ilusão de que a mulher dos sonhos pode ser real, ele mergulha na relação com a mesma precipitação de uma criança frente um sorvete derretendo. Substitui o clichê do macho alfa pelo do apaixonado babão e inicia o processo de aprisionamento da amada com regalias e submissão sufocantes. Se ela tiver tudo, não irá embora, certo? Errado. Ao contrário dos homens, as mulheres sabem dizer adeus.

Mas exatamente como a traída que finge não saber das escapulidas do marido, o homem apaixonado e feliz prefere manter-se cego às inquietações da amada. Afinal, validá-las seria reconhecer que, talvez, ele não seja o homem da vida da mulher da sua vida, não é mesmo?

Crente na ilusão de que as mulheres se realizam no casamento, o pobre ajoelha-se, jura amor eterno e dá entrada no apartamento. Acha que assim ela fica. E fica mesmo, por um tempo. Porque mesmo um conto de fadas mentiroso ainda é melhor do que a solidão. “E ele me trata tão bem…” pondera ao som do ronco irritante do amante que virou colega.

Só que no fundo eles sabem – sim, os dois – que o dia do “até que a morte os separe” vai chegar e que, quando isso acontecer, quando a ficha cair, ela vai correr, fugir como uma louca para bem longe daquela prisão que ela mesma ajudou a construir, com seu medo diário de mostrar-se imperfeita.

E ele ficará lá, chorando no bar com os amigos, sem entender o que fez de errado, pensando na toalha molhada na cama, no futebol de terça, na sogra, naquele dia naquela festa… “terá sido isso?” Enquanto ela, sozinha, sem casa e ideia do que fazer a seguir, respira, aliviada, o ar da liberdade. “Ele merece alguém que o ame de verdade. Um dia seremos amigos”, reflete, com frieza, para aliviar o protocolar sentimento de culpa.

Se o príncipe abandonado compreendesse que, mergulhado na fantasia reconfortante de que aquele amor seria eterno, ele nunca se deu ao trabalho de observá-la mais de perto, perceberia que a “mulher da sua vida”, na verdade, jamais se mostrou inteira, completa, com todas as suas complexidades e defeitos. Quem sabe ao fazer isso, ao se dar conta de que nunca realmente a teve, ele, por fim, entenda por que ela foi embora.

Aos narigudos:

Tudo bem se uma mulher reclama por achar o próprio nariz grande demais. Afinal, em meio a formas arredondadas e suaves, qualquer detalhe mais exagerado destoa do conjunto, comprometendo-o. Agora, quando a mesma reclamação provém do sexo oposto, não dá para aceitar.

Embora uma napa avantajada não seja necessariamente sinônimo de beleza (Deus me livre defender esse argumento!), um nariz grande possui muito mais sex appeal do que aquelas coisinhas delicadas que nem bem notamos. A tal da harmonia estética fica por conta do modo como combinam com as outras partes do rosto: se o resultado for simétrico, é fascínio à primeira vista. Assim como maxilar quadrado, sobrancelhas grossas e barba passam uma sensação de virilidade, os narigudos nos parecem… mais homens.

E todos os bem-dotados nasais com um mínimo de sensibilidade e, claro, auto-confiança, sabem disso. Eles entendem que seu nariz é o que os difere dos outros – tantos – bonitinhos espalhados por aí. Uma espécie de marca registrada, transbordando atitude e sensualidade por onde passam.

Aos namorados carentes:

No começo, ela só tinha olhos para você. Uma única gracinha já derretia seu corpo quente. Um simples beijo e aquele mulherão era seu. Hoje, seus lábios (mais frios) se tocam tanto quanto suas piadas a fazem rir. De repente o trabalho, a família, os amigos, o futuro… todos fortes concorrentes pela atenção da moça. E você, de alma gêmea, tornou-se… namorado.

Não foi culpa sua – nem dela! Embora tivessem certeza de que sua relação seria diferente, especial, única, ela não é. E agora você se percebe flertando com colegas de trabalho, retomando velhas amizades, vendo os amigos com mais frequência. Que bom! Aquela fase grudenta, de idolatria quase sufocante à “mulher da sua vida” já tinha dado o que tinha que dar mesmo.

Ela também está prestando mais atenção em outras alternativas e avaliando novas possibilidades. De sexo, de romance, de elevação da auto-estima. Estranho seria se não o fizesse. Afinal, você não é mesmo tudo isso. Sem ofensa! É que nenhum ser (pelo menos não humano) é capaz de corresponder a todas as expectativas criadas sobre ele. E por isso tanto ela, quanto o namorado dela (você), estão assim…meio abandonados. Mas não se preocupe. Logo vem aquele sentimento de culpa, um arrependimento sem fim por não ter dado o devido valor à sua grande companheira (“isso é que é mulher!”) e qualidades nunca antes notadas no caráter da moça substituirão, em seus pensamentos, todo o charme e contornos daquela vizinha que – imagine só! – ainda o acha engraçado.

Não aconteceu?