A despedida

Manhã de terça (15), salão de beleza, América chega esbaforida. Coloca a bolsa no armário, vê sua lista de clientes na agenda, olha em volta e manda: “Rita, disseram quando vão colocar a TV aqui?” A colega manicure reproduz o que ouviu minutos antes: “É preciso paciência”. A voz alterada de América deixa claro seu descontentamento. “Gente, sem televisão não dá! Ontem cheguei atrasada porque queria ver o Ronaldo se despedindo. Só pensava que não ia dar para ver aqui. Como vou perder ele se despedindo? Tem que ter uma TV!”

Sim, era preciso uma TV. Porque Ronaldo não se despediu apenas do futebol, se despediu da gente. Tudo bem, o peso, as lesões, a idade, a performance em campo… tudo já indiciava seu adeus. Ele tinha avisado, não é mesmo? Disse quando e onde encerraria a carreira. Mas, mesmo sabendo de tudo isso, e mesmo tendo sentido tanta raiva dele em tantos momentos, meus olhos se encheram de lágrimas ao assistirem, impotentes, à despedida de meu ídolo. Eu sei que foi melhor para nós dois. Parar enquanto há respeito e carinho, antes de a relação ser envenenada por cobranças, pressão e decepções. Mas, mesmo assim, eu chorei, viu? Sem vergonha, orgulho ou medo da boca pequena. Chorei por mim e por ele (porque ele também está sofrendo muito que eu sei). E, assim, com essa saudade estranha de quem a gente entende porque foi embora, sabe que não volta e no fundo prefere assim, fui fazer as unhas no dia seguinte.

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Ronaldo, se eu consegui…

Eu já fui gordinha. Pronto, falei. Gordinha quanto? Bom, digamos que eu voltei de uma temporada fora do país e minha mãe não me reconheceu. É, pode dar risada. Parentes agendavam visitas para ver a “obesa” de perto. Amigas tentavam camuflar o choque com frases como “ai, nem tá tão gorda, vai”. E eu me esforçava para agir como se acreditasse. De comprar roupas a flertar na balada, tudo exigia uma dose extra de autoconfiança, em um esforço contínuo de se mostrar “bem”, “segura”. Um ano e muitos “não, obrigada” depois, perdi os quilos que tanto me incomodavam. Sim, emagreci porque estava infeliz com aquelas formas (redondas!), mas confesso que muito da minha força de vontade e disciplina veio da cobrança social. Apesar de às vezes cruel e insensível, a torcida acaba nos impulsionando para tomar uma atitude que, sabemos, nos fará bem. Foi em grande parte graças aos “corneteiros” que hoje finalmente me sinto “bem” e “segura”.

Juro que tentei

Eu tentei defender o Ronaldo. Dizia que para um jogador como ele alguns quilos a mais não faziam diferença, que ele já havia superado tantos desafios nessa vida que esta fase “mais cheinha” era coisa passageira, que eu não estava nem aí para o peso dele, porque, bom, ele é o Fenômeno! Mas quando o vi no treino semana retrasada… Poxa, Ronaldo, toma jeito e perde essa barriga! Não quero te ver dizer “não, obrigado” ao futebol, só mesmo ao chorizo do Pobre Juan (restaurante em São Paulo).

Coluna publicada no jornal MAIS em 15/08/2010